terça-feira, 30 de março de 2010

Vida Real

Eu o conheci em uma noite qualquer.
Uma noite que não prometia nada.
Jogada no sofá, perdida em pensamentos, tive aquela estranha sensação.
Fiquei inquieta. Uma agitação insana me tomava por completo.
Andei pela casa. Abri a geladeira em busca de algo.
Mas o que era mesmo? Esqueci.
Sentei. Levantei. Liguei o rádio. A televisão.
Tudo só fez aumentar minha angústia.
Resolvi sair. Caminhar. Respirar.
Ao ar livre sempre me sinto melhor.
Caminhei pela areia por muito e muito tempo.
A água do mar chegava aos meus pés.
Tudo tão silencioso. Tudo tão bom.
Ao longe vi um casal de apaixonados.
Se abraçavam. Se beijavam. Curtiam aquele momento à dois.
E era tão lindo ver os dois ali na areia. Uma sensação boa me dominou.
Nada mais parecia importar. Os olhos de ambos estavam conectados.
O coração e o amor em perfeita simetria.
Meus passos diminuíram. O ponto final estava prestes a ser atingido.
Me sentei na areia e contemplei o céu.
A lua tão bela e imponente... Os barcos cruzando o horizonte.
A escuridão invadia cada partícula minha.
O vento era calmo. Bagunçava meus cabelos.
As ondas seguiam seus eternos movimentos.
Entre tudo isso, estava eu. Sentada na areia.
Desprovida de qualquer companhia. Sozinha.
Sem nenhum bem material. Sem nenhum barulho ensurdecedor.
Houve um momento em que pude sentir até meu coração pulsando.
E nesse momento eu me petrifiquei.
Queria que aquele instante fosse eterno.
Escutar aquele movimento dentro de mim trouxe lágrimas à meus olhos.
Apesar de tudo, meu coração
não havia desistido de seus movimentos.

Ele sabia o quão necessários eram esses pulsos à mim.
Independente de qualquer situação meu coração não ia desistir de mim.
Muitas vezes eu insisto em maltratá-lo.
Causo danos irreparáveis. Engano-o.
Faço ele sofrer. Mas ele ainda bate.
E havia muito tempo que eu não parava para escutá-lo.
Fiquei naquela inércia por muito tempo. Fechei os olhos.
As lágrimas fluindo livremente. O coração no seu ritmo.
Tudo na mais perfeita ordem como eu sempre desejei.
Quando abri meus olhos, ele estava sentado ao meu lado.
Me assustei. Muito.
Ele sorriu. Um sorriso estupendamente lindo.
E o melhor: sincero.
Ficamos a nos contemplar. Olhares trocados.
Silêncios compartilhados. O tempo foi passando.
E eu senti que o fim daquele momento estava próximo.
Tive que me levantar e seguir meu caminho.
Os últimos olhares foram os mais profundos.
Nenhuma palavra foi trocada. Nenhum nome foi dito.
Nenhum toque sentido. O que nos unia era aquele mar.
Aquela lua. Aquela calma.
Fomos capazes de deixar o silêncio falar por nós.
Um encontro breve, mas inesquecível.
Nenhuma certeza de um reencontro foi levantada.
O que ocorreu ali foi único.
Acho que aquela angústia que me tomava, queria mostrar-me algo.
Eu continuo viva. Não estou desprovida de emoções.
Preciso acreditar que meu coração vai me levar até onde for necessário ir.
Um encontro por acaso. Olhares trocados. Dois corações batendo.
Nenhuma necessidade exposta.
Aquela simples presença me fez ver o quão raros
e especiais são os momentos da vida.
Eu não o procurei. Não saí por aí disposta a encontrá-lo.
Nos encontramos ao mesmo tempo.
E nosso silêncio se encarregou do resto.
O fim de tudo, ocorreu às 6:30 da manhã, quando o despertador
me trouxe de volta a vida real...




"O destino trama os dias

e desfaz o sonho: demarca
meus contornos, partes
disso que sou e serei.
Quem sabe desejei demais:
milagres não me bastaram,
mas quando eu quis ser rainha
fui simplesmente humana."
(Lya Luft)

Um comentário:

  1. Aqui tu deu uma de Duca Leindecker :p

    Me surpreendeu no fim.

    Ótima estória

    :)

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